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quarta-feira, 15 de abril de 2015

--- O Quadro-mágico Não É Traduzível.

O “quadro-mágico”, não obstante tenha uma mensagem religiosa subliminar, não é traduzível.                    
                 As Traduções sugeridas por alguns pesquisadores e ocultistas (?), para este palíndromo, são equivocadas porque o quadro-mágico SATOR AREPO TENET OPERA ROTAS, não obstante tenha sido criado para passar uma mensagem submilinar religiosa, não quer dizer absolutamente nada, não pode ser o mais antigo do mundo e a indicação da época anunciada para sua criação é desprovida de fundamento.     
                    
                      Vamos aos fatos: em 1936 o pesquisador italiano Matteo Della Corte deparou-se com uma cópia do "quadro-mágico" nas ruínas de Pompéia, cidade soterrada pelo vulcão Vesúvio no ano 79 d/C. 

                     O inesquecível Prof. Júlio César Mello Sousa (que se notabilizou com o heterônimo de Malba Tahan), em seu livro Matemática Recreativa (Malba Tahan, “Matemática Recreativa”, (1o Volume, Editora Saraiva, São Paulo, 1965), informa, por sua vez, que ele está registrado num manuscrito do século XVII,  da Biblioteca Nacional de Lisboa e que o arqueólogo francês, Prof. Franz Cumot, por volta do ano de l933, na Ásia Menor, encontrou-o entre ruínas que remontam ao III Século d/C. 
                  
                    Com base em informações do escritor inglês John Anthony Bowden Cuddon, outrossim, o  escritor Otto Lara Rezende, em artigo publicado no jornal "O Globo", de 13  de  julho de 1986, sob o título  "Palíndromo & Capicua", afirma que “no VI século da era cristã, as cinco palavras sofreram uma corruptela na Etiópia e ficaram conhecidas como sendo os nomes dos cinco cravos da cruz de Cristo. Já na França, seriam as cinco chagas. 

                    Ainda com fundamento na mesma fonte, o saudoso escritor, na referida crônica, informa que "na América do Sul, o miraculoso palíndromo cura mordida de cobra e facilita o parto. Mas ninguém sabe direito o que  significa”. Enganou-se o mestre. A  informação estava submersa numa obra publicada em 1923. Alguém já sabia, sim, pois sobre ele se debruçara até conseguir encontrar a ponta do fio da meada que veio permitir que se desvendasse os segredos que o cercavam. 

                   É bom esclarecer, de início, que não foi um estrangeiro o autor dessa proeza, mas um intelectual brasileiro, nascido no século 19, chamado João Ribeiro (dados biográficos ao final). Mas Otto ignorava o fato. É o que demonstrarei mais a frente.

                   Oportuno esclarecer, ainda, que o quadro não comporta qualquer tradução, uma vez que as palavras que o compõem, com exceção de TENET, não pertencem ao idioma latino, consoante afirmaram todos os latinistas consultados à época em que escrevi TUCANO NA CUT (1996), inclusive o prefaciador do meu livro – latinista emérito – o jornalista Sebastião Nery. 

                   Diga-se, de passagem, aliás, que se ele tivesse sido escrito em latim, na certa, não haveria tantas pretensas traduções e/ou interpretações dispares.     
             
               Por essa razão, todas as versões de pesquisadores, escritores e ocultistas (?), de várias nacionalidades, que pretenderam revelar seu significado, por meio de tradução, estão equivocadas. Para ser enfático: são desprovidas de qualquer fundamento cientifico e não passam de meras especulações ou interpretações esotéricas de escritores que deram asas à imaginação e adivinharam, deduziram ou interpretaram qual "deveria ser" a mensagem do  autor do quadro-mágico, sem um mísero fato que comprovasse a “descoberta”.  

                 Mesmo assim, tenho lido em “sites” e Blogs - e até na Wikipédia - comentários sem maiores indagações sobre o quadro, seguidos de uma dessas versões - como se fossem realmente traduções irretorquíveis, definitivas, principalmente a do ocultista (?) francês Georges Barbarin, bastante utilizada: “Deus, Criador, mantém com cuidado o Mundo em sua órbita”.

                  Alguns dos que ousaram "interpretá-lo", outrossim, mesmo partindo de pressuposto correto, isto é, que as palavras do "quadro-mágico" são puramente simbólicas, “consideram” que há para cada uma delas, consoante o ensinamento do ocultismo (?), uma interpretação especial.  

                  Assim, para os "adivinhos" eles teriam o seguinte significado:

                                        SATOR     =   o Criador; Deus;
                                        AREPO     =   o Mundo; a Humanidade;
                                        TENET     =   suster; manter.
                                        OPERA     =   cuidado; trabalho;
                                        ROTAS     =   rotação; trajetória;
           
                                            
                  Malba Tahan, comentado com fina ironia esta ilação, faz a seguinte observação:

                “Uma vez fixadas essas interpretações (que nos parecem um tanto arbitrárias) teríamos para a famosa legenda: Deus, Criador, mantém com cuidado o Mundo em sua órbita. É essa uma tradução interessante, que não atende, porém, às normas dos latinistas nem as exigências dos matemáticos”. 

                Existem outras versões em torno do histórico palíndromo - algumas até elaboradas com bastante erudição - na base do seria-isso-seria-aquilo, que também não atendem às normas aludidas pelo imortal matemático. 

                   Numa delas, SATOR seria a forma reduzida de Salvador e o AREPO teria sua origem na frase cabalística A Rex Et Pontifex  O ( o A  e  o  O,    primeira   e   última  letras  do alfabeto grego simbolizam o princípio e  o  fim).  E o palíndromo teria o seguinte significado: “O Salvador, começo e fim, rei e pontífice, proteja as obras e os instrumentos agrícolas”. 

             Noutra versão esse palíndromo teria origem em SAT ORARE P  O (per omnia) e o palíndromo seria: “É suficiente orar sempre (e assim) fica o trabalho  diário  no caminho certo”. 

             Mais uma sugere que o SATOR AREPO poderia ser o semeador (ou pai) Arepo e o palíndromo assim se traduziria: “Arepo,  o semeador,  segura as rodas durante o trabalho”.

               Uma quarta variante tenta elucidar o enigma partindo da premissa de que AREPO seria apenas anagrama de  ARchi EPiscOpus. 
             
               Conforme Malba Tahan, o Prof. Mansur Guérios dá duas interpretações ao quadrado mágico. Na primeira, “O agricultor cuida da lavoura e eu passeio de carro” (que me perdoem, mas esta chega ser hilariante). Na outra: “Sator, o pastor, tem suas obras encaminhadas”.
                
             Além dessas ilações ou traduções mistificadoras - perdoem-me a veemência - chamam à atenção nesse histórico anacíclico as contradições sobre a data ou época em que foi produzido e o caráter religioso e místico que o cerca. Irei examiná-los à luz do meticuloso ensaio do jornalista e escritor brasileiro João Ribeiro, “Colméia” - Edição Monteiro Lobato & Cia., 1923 (que considero - de tudo que li sobre o assunto - o único estudo baseaado em fatos e, por isso, com fundamento cientifico, sobre a origem deste palíndromo). 

                Recapitulemos: 

              Primeiro: consoante Malba Tahan, citando o escritor inglês John Anthony Bowden Cuddon, este quadro-mágico, extraído de um papiro egípcio, dataria do IV ou V Século antes de Cristo.

              Segundo: informações históricas afirmam que uma cópia deste quadro-mágico foi descoberta nas ruínas de Pompéia, catástrofe ocorrida no século primeiro da era cristã. 

             João Ribeiro, após pesquisas, sustenta e comprova em seu estudo que as palavras constantes do mesmo apenas formam um jogo onomástico com os nomes dos Três Reis Magos, nomes que encontrou em histórico livro sobre o catolicismo publicado na Inglaterra. Eis o que diz João Ribeiro

“Encontramo-los nas - “Reflections on the devotions of the Roman Church”- onde   se registra entre outras, a variante de que  os  reis se chamavam: - ATOR, SATOR  e  PERATORAS. Examinando essa onomástica vemos, desde logo, o nome “SATOR”,  que é o primeiro da fórmula; ROTAS”, que é a inversão literal do mesmo nome,  artifício comum nos ensalmos (“ credo” às   avessas e outros). E o começo de “PERATORAS”, sugere “OPERA”. Nova inversão de – OPERA - nos dá literalmente “AREPO”. 

Desta arte ficam por inversão esclarecidas quatro palavras da fórmula:
                     Sator - (Rotas)
                     Opera - (Arepo)
São estes dois nomes de Reis Magos, segundo a variante mencionada.
Resta, apenas, explicar a presença e o sentido da palavra média do ensalmo: “TENET”.
Tem o aspecto (que considero fortuito) do vocábulo latino, mais creio que será de outra origem.
Como quer que seja acho que esse é para mim o único ponto obscuro da famosa fórmula e que não logro explicar.
Contudo, se dispusermos os quatro nomes conhecidos, todos eles de cinco letras poderemos esclarecer sua origem:
                    
                                                       S   A   T   O   R
                                                       A   R   E   P   O
                                                        .    .    .     .    .   
                                                       O   P   E   R   A
                                                       R   O   T   A   S

Os pontos que representam lacunas devem  resultar das  terceiras letras t, e, n, e , t   indispensáveis para a leitura no sentido vertical,  de cima para baixo.”

                        Digo eu, agora: 
               
                   a) Esse vocábulo (TENET), bem sugestivo para completar o palíndromo, possui dois oportunos T, cujo formato é indiscutivelmente de cruz, grande símbolo dos cristãos, não obstante, no palíndromo, aparentemente, não tenha qualquer significado, a não ser o caráter místico da referida letra.  
              
                       b) o terceiro nome, ATOR - detalhe que deixou de ser mencionado por Ribeiro - já está implícito no nome de SATOR e, assim, revelam-se no palíndromo os nomes dos três Reis Magos.  

                       Deste estudo, enfim, nos restam três inequívocas conclusões:

                1) este quadro-mágico foi criado com os nome dos Reis Magos para homenageá-los (históricos ícones do cristianismo) e, justamente por esse fato, só pode ter sido criado após o nascimento de Cristo e logo no início da era cristã, aproximadamente entre o início da mesma e o ano 79 d/C, ano da destruição de Pompéia pelo Vesúvio, em cujas ruínas a cópia foi encontrada. 

                   2) por se tratar de uma criação onomástica, com os nomes dos aludidos Reis, não tem tradução;

                3) a religiosidade e misticismo que   o   cercam nada têm a ver com uma mensagem que alguns tentam extrair do texto, mas, sim, com o que representavam e representam para os cristãos, desde priscas eras, os nomes daqueles Reis, que foram os primeiros seres humanos a visitar (levando três presentes) os pais de Jesus Cristo, logo após o seu nascimento.   

                As datas das ruínas, nas quais a famosa legenda foi encontrada - na Ásia Menor e em Pompéia - todas posteriores ao nascimento de Cristo, dão total guarida à conclusão.

              Assim, como eu creio estar comprovado, cientificamente, sem adivinhações de qualquer espécie, as conclusões de João Ribeiro - ao contrário do que afirma o inglês CUDDON - esse palíndromo não foi criado quatro ou cinco séculos a/C, não quer dizer absolutamente nada e, também, não é o mais antigo do mundo. Afinal, ele teria, atualmente, cerca de vinte séculos e Sótades já os criava trezentos anos a/C. (Sótades da Maroneia, poeta e satírico grego, a quem os historiadores atribuem a invenção do palíndromo - viveu no Século III a.C. - que, além de escrever versos eróticos, inventou, ainda, os versos denominados de "sotádicos", que tanto se pode ler da esquerda para a direita, quanto da direita para a esquerda, ou invertendo a ordem das palavras, sem alteração do sentido). 

             Ademais, se trata de um palíndromo sofisticadíssimo e seria absurdo pensar que alguém, a qualquer época, tenha chegado ao formato do quadro mágico, sem antes passar pela simples construção frasística, sem característica de acróstico. O autor desse palíndromo, seja ele quem for - provavelmente um religioso de ofício - teria feito, anteriormente, um anacíclico sem esse formato. Mas ainda assim, ele não seria o mais antigo, porque Sótades o antecedera em três seculos.
             
                Finalmente, só para argumentar, imaginem alguém começar a produzir seu primeiro palíndromo logo pelo jeito mais difícil, isto é, podendo ser lido em todas as direções. Nem mesmo se essa criação fose atribuída a Hercules, autor de inúmeras façanhas - mesmo assim - eu não acreditaria.  

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Obs: quem estiver interessado poderá ter informações mais detalhadas sobre esse assunto nas páginas do meu livro que encontrarão neste blog sob o título "O palíndromo mais antigo do mundo???"

*João Ribeiro, nascimento 24/06/1860 Laranjeiras, Sergipe. Falecimento 13/04/1934 Rio de Janeiro Rio de Janeiro, RJ (Brasil) foi membro da Academia Brasileira de Letras. Além de inúmeras outras qualificações “era professor, filólogo, lexicógrafo, historiógrafo, folclorista, tradutor, jornalista e crítico literário” (“Dicionário Universal Nova Fronteira de Citações”, Paulo Ronai, 1a. Edição, 1985). 

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